Mesmo guardando uma biodiversidade única e culturas milenares, e sendo peça-chave no combate às mudanças climáticas, a Floresta Amazônica e seus habitantes estão em perigo há várias décadas. Com o objetivo de defender seus direitos, no dia 17 de outubro de 1985, o ativista, político e seringueiro Chico Mendes articulou o 1º Encontro Nacional dos Seringueiros, em Brasília (DF). Ali também nasceu o Conselho Nacional dos Seringueiros, atualmente reconhecido como Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), que está completando 37 anos de atuação.
Surgido com a união de várias organizações populares da Amazônia, como o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri (STTRX) e a Associação dos Seringueiros e Soldados da Borracha de Rondônia (Asboron), o CNS foi fundamental para a idealização de políticas públicas em prol dos povos das florestas. Na época, o país havia acabado de retornar ao sistema democrático, era presidido por José Sarney (PMDB), e o debate público abordava reforma agrária apropriada aos seringueiros, educação, saúde e política de valorização da borracha nativa.
Além de reivindicar direitos aos trabalhadores extrativista da floresta Amazônica, o CNS também formulou o conceito de Reserva Extrativista (Resex), uma modalidade que entrou em vigor, em 1990, e visa a proteção e o uso sustentável dos recursos naturais, assegurando o direito de comunidades tradicionais aos territórios onde sempre viveram, com demarcação feita pelo Estado.
Após receber ameaças constantes de fazendeiros locais e pessoas contrárias às ideias de justiça social, Chico Mendes foi assassinado em sua residência, na cidade de Xapuri (AC), em 1988. O fato virou notícia Brasil afora e provocou indignação, e a pressão sobre o governo brasileiro levou à criação de políticas ambientais de controle do desmatamento, como as Resexs.
Mesmo assim, Chico Mendes instituiu o legado do valor que a Floresta Amazônica possui com sua biodiversidade , abrangendo a conservação da sociobioiversidade junto com seus potenciais econômicos e sociais. Isso inclui também a atuação de povos tradicionais em sua proteção.
Aliança dos Povos da Floresta
Surgida em janeiro de 1987, formada pelo CNS e pela União das Nações Indígenas (UNI), a Aliança dos Povos da Floresta visa fortalecer os vínculos entre indígenas e seringueiros, e integrar desejos pela defesa da mata e de um modo de vida comum entre as partes. Entre seus principais nomes, encontravam-se no início Jaime Araújo, presidente do CNS, Osmarino Amâncio, líder seringueiro, Soeiro Sales Cerqueira Kaxinauá, líder indígena, Chico Mendes, presidente do STTRX, e José Correia da Silva Jaminawá, jovem líder indígena.
Em agosto de 1988, durante um seminário sobre a Amazônia Constituinte organizado pelo Instituto de Estudos Amazônicos (IEA), em Curitiba (PR), Chico Mendes, Jaime Araújo e Ailton Krenak reafirmaram seus compromissos, e convidaram as organizações indígenas do sul do país para participar do movimento.
A consolidação se deu em março de 1990, pouco tempo depois do asssassinato de Chico Mendes. A cerimônia foi o II Encontro Nacional dos Seringueiros e o I Encontro dos Povos da Floresta, em Rio Branco (AC).
Outro momento memorável aconteceu em janeiro de 2020, quando a união foi reafirmada durante o encontro Mebengokrê, entre o líder indigena Kayapó Raoni Metuktire, Ângela Mendes, filha do patrono do CNS, e Júlio Barbosa de Aquino, atual presidente do CNS. A cerimônia foi marcada pela presença de mais de 500 lideranças indígenas e realizada na aldeia de Piaraçu, às margens do rio Xingu, no Mato Grosso (MT).
Aniversário de 37 anos
Atualmente, o CNS representa os interesses de trabalhadores que têm suas atividades baseadas na economia extrativista, como seringueiros, soldados da borracha, coletores de sementes, integrantes de projetos agroflorestais, extratores de óleo e plantas medicinais, pescadores artesanais e todos os que exploram recursos naturais de forma sustentável.
Desde a aprovação do Estado para criação de Resexs, o CNS, com apoio de associações locais e entidades representativas, já conquistou a proteção de aproximadamente 38 milhões de hectares em diferentes biomas e em mais de 500 unidades territoriais como Resexs Florestais e Marinhas, Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS), Florestas Nacionais (Flona) e Projetos de Assentamento Agroextrativista (PAE).
Com o objetivo de garantir dignidade e qualidade de vida aos habitantes da região amazônica, o CNS também tem estabelecido parcerias para implantação de projetos de saneamento e acesso à água, inserção de produtos no mercado institucional, acesso à habitação e energia, apoio a famílias vulneráveis para evitar o desmatamento, acesso à educação básica e ao ensino superior, entre outros benefícios.
Desde novembro de 2019, quando realizou seu IV Congresso, o CNS é presidido pelo seringueiro Julio Barbosa de Aquino, um dos principais nomes do movimento. Com intuito de inovar e democratizar as relações de poder na instituição, a eleição seguiu critérios com composição paritária de homens e mulheres, representação relevante de jovens e de extrativistas de outras regiões do Brasil, além da Amazônia.
Por fim, o CNS se destaca, também, nas discussões nacionais e internacionais que tratam dos interesses dos extrativistas, no que se refere ao papel das populações extrativistas no cenário das mudanças climáticas globais.
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